Aumento do IOF encarece atividade produtiva, dizem especialistas

São as empresas pequenas, médias e grandes que vão arcar com a maior parte da conta do aumento de impostos anunciado ontem pelo governo Lula para tentar fechar as contas públicas sem déficit este ano.


O governo anunciou um corte de R$ 30 bilhões nos gastos públicos e um aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para pessoas jurídicas, que visa arrecadar outros R$ 20 bilhões. O pano de fundo foi a revisão de receitas e despesas do governo - a previsão (otimista) de R$ 14 bilhões este ano no caixa da União foi substituída por uma projeção de R$ 50 bilhões de gastos superando as receitas. 

O IOF é um imposto complexo que tem uma taxa fixa e uma taxa diária. No caso das pessoas jurídicas, a parte fixa subiu de 0,38% para 0,95% por operação, e a alíquota diária, que antes começava em 0,0041%, foi para 0,0082%. Resultado: o imposto que antes podia chegar ao teto de 1,5% ao ano (dependendo do prazo), agora pode custar até 3,95% ao ano. 

"Toda vez que aumenta o custo do capital, você está desestimulando o investimento produtivo. Empresas que precisam tomar empréstimos vão ter de pagar mais imposto num momento em que a taxa de juros já está muito alta. Talvez seja um tiro no pé de um governo que vive dizendo que o Brasil precisa de mais crédito", avalia Rafael Schiozer, professor de finanças da FGV (Fundação Getúlio Vargas), em São Paulo. 

"As empresas que captam recursos com linhas de crédito terão um aumento relevante no custo de captação e, com isso, maior dificuldade em financiar o caixa e investimento no negócio", disse Fernando Aubin, diretor tributário na Forvis Mazars, na mesma linha, sobre o impacto das novas alíquotas sobre atividades produtivas. 

Pequenas e médias empresas

De uma hora para outra, o custo máximo do imposto sobre as empresas que estão no Simples nacional (faturamento de até R$ 4,8 milhões por ano) mais que dobrou: de 0,88% para 1,95% ao ano. A maior parte das atividades produtivas no Brasil está abrigada no Simples Nacional, regime que tem inscritas mais de 18 milhões de empresas. 

"A grande empresa pode ter instrumentos para absorver melhor o novo custo. Para os pequenos, que já estão operando com o capital apertado, não há escapatória. Se uma empresa precisa por exemplo antecipar R$ 10 mil em recebíveis para manter seu capital de giro, ela vai pagar mais imposto", disse Schiozer, da FGV. 

Segundo Schiozer, a medida terá caráter inflacionário porque as empresas que não conseguirem absorver nos seus balanços a nova alta de impostos vão repassá-la ao consumidor. 

Esta observação do professor tangencia uma questão importante, que é a divergência entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central em torno das medidas anunciadas ontem. O ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que as as medias não haviam sido negociadas com o Banco Central. 

Circulam, entretanto, relatos de reuniões tensas entre representantes da Fazenda e do BC sobre o pacote. Segundo essas fontes, Gabriel Galípolo, o presidente do BC, não apenas não endossou a alta do IOF como foi contrário a ela, alertando para seus efeitos inflacionários e de sinalização negativa ao mercado. 

"Qualquer operação de crédito para pessoa jurídica no Brasil, independente de tamanho, ficou mais cara a partir de hoje. O IOF foi concebido como um instrumento extrafiscal, isto é, um meio do governo intervir em necessidades, como uma eventual crise cambial, mas as mudanças de alíquota agora têm o sentido de arrecadar mais", resumiu o advogado tributarista André Novaski, sócio do Demarest, um dos maiores escritórios do país. 

Câmbio 

Um outro aspecto potencialmente problemático do pacote recai sobre empresas com operações de exportação e importação. Algumas operações de câmbio, que antes pagavam IOF de 0,38%, agora podem ser tributadas em 3,5%. 

Operações de hedge, um seguro contra variações bruscas do câmbio, também ficaram mais caras. Schiozer, da FGV, aponta para o risco de desestímulo à proteção cambial. 

"É importante que a maioria das empresas estejam protegidas. Se não estiverem, quando vem uma pancada no câmbio, isso espalha para o resto da economia, que sofre. Já vimos acontecer aqui em 1999", afirma ele. 

Em janeiro de 1999, o governo FHC abandonou o regime de câmbio fixo e permitiu que o real flutuasse livremente frente ao dólar. Pressionado por uma crise cambial, perda de reservas internacionais e ataques especulativos, o Banco Central deixou de sustentar artificialmente a cotação da moeda, o que levou a uma desvalorização abrupta: o dólar, que valia cerca de R$ 1,20 no início do mês, chegou a superar R$ 2 em poucas semanas. Foi um baque para quem tinha dívida em dólar e nenhum seguro

Fonte : https://www.demarest.com.br/

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